Segunda-feira, 6 de Novembro de 2006
Ainda faltam quatro anos para que se atinja um acordo global sobre o clima que sustente o mercado internacional de carbono, disse hoje o secretário executivo da Convenção das Partes sobre as Alterações Climáticas, Yvo de Boer.
Os mercados de carbono limitam as emissões dos gases de efeito de estufa e obrigam os países que ultrapassam as quotas estabelecidas a comprar direitos de emissão aos países que não a atingem.
Um mercado global de carbono vai permitir que os países que ultrapassem as quotas negoceiem direitos de emissão com outros estados, o que reduziria o custo dos cortes de emissões de que o mundo ainda precisa, de acordo com as estimativas de alguns especialistas.
Mas ainda faltam quatro anos para que haja um acordo nesse sentido, disse Yvo de Boer, chefe da Convenção-Quadro da ONU sobre as Alterações Climáticas, na abertura da conferência, que está a decorrer em Nairobi até 17 de novembro.
"A frustração justifica-se", disse Yvo de Boer aos repórteres. "Está tudo a caminhar devagar. O problema é que os interesses dos países entram em conflito em muitas áreas."
Os países produtores de petróleo, por exemplo, temem o impacto da limitação do carbono no Produto Interno Bruto. Enquanto os estados insulares pequenos temem ser inundados pela subida do nível do mar, enquanto países em desenvolvimento querem colocar o combate à pobreza à frente do controle das emissões.
A ONU já supervisiona um comércio global de carbono entre países pobres e ricos. "Acho que vamos fazer a contabilidade. E, quando se conhecerem, em 2010, as ambições dos países industrializados, o preço do carbono ficará mais claro", concluiu de Boer.
Nos primeiros nove meses de 2006, o mercado de carbono chegou a quase 22 biliões de euros, valor que duplicou em relação a 2005, disse o Banco Mundial no mês passado. Este mercado é dominado pela iniciativa da União Européia, que é vista como um modelo para um futuro mercado global.
O secretário executivo da Convenção das Partes sobre as Alterações Climáticas, Yvo de Boer, diz que quer “mais acção e menos palavreado”, e sublinha a necessidade de “tornar mais acessível o MDL” (Mecanismo de Desenvolvimento Limpo), que tem como objectivo transferir, para os países em desenvolvimento, tecnologias mais eficientes do ponto de vista energético.
Curiosamente, a Austrália, que não ratificou o protocolo de Quioto, não concorda com as palavras de Yvo de Boer. Para esta conferência o governo de Camberra leva uma proposta de revisão do artigo 9, que fala da transferência de tecnologia; e, tanto a Austrália como a Rússia que os compromissos assumidos sejam de caracter voluntário e não vinculativo.
Concluído a 11 de Dezembro de 1997, em Quioto, Japão, o protocolo, que entrou em vigor em Fevereiro de 2005, determina uma redução das emissões de seis gases com efeito estufa que provocam o aquecimento do planeta: CO2 (dióxido de carbono), CH4 (metano), óxido nitroso (N20) e outros três gases (HFC, PFC, SF6).
No período 2008-2012, data em que termina a vigência do protocolo, os 35 países do anexo I do tratado e que representam no conjunto um terço das emissões mundiais, terão de reduzir as emissões de gases de efeito de estufa em 5 por cento relativamente ao ano de referência de 1990.
Os Estados Unidos da América, responsáveis por outro terço das emissões globais, e a Austrália são os únicos grandes países industrializados que não ratificaram o protocolo.
Outros grandes poluidores, como a China e a Índia também não estão abrangidos por metas de redução, já que são considerados países em desenvolvimento.
Os cientistas mundiais prevêem para os próximos 100 anos aumentos de temperatura que podem chegar aos 5,8 graus Celsius. Estes dados foram revelados num relatório do IPCC, a sigla em inglês para Painel Intergovernamental para as Alterações Climáticas.
Cada dia que passa as previsões são mais pessimistas. No seu último relatório o IPCC, alerta para aumentos de temperaturas nos próximos 100 anos que podem chegar aos 5,8 graus Celsius.
O IPCC lança agora dados duas vezes mais pessimistas dos que as previsões feitas no estudo anterior. E segundo os cientistas a responsabilidade destas previsões vai para o grande impacto do Homem neste planeta.
O IPCC já fez três estudos globais sobre o clima e desde a sua criação no topo das preocupações continua a poluição industrial e os transportes. Este são os grandes poluidores do mundo.
Entretanto, também nos países em desenvolvimento se fazem sentir altos níveis de emissões. Por um lado, a precária adaptação tecnológica das industrias destes países não permite o controlo das emissões de gases de efeito de estufa. E, por outro lado, a utilização intensiva de carvão e da madeira para cozinhar também contribuem para o aumento das temperaturas. A cozinha é aliás considerada a quarta grande responsável pela emissão para atmosfera de gases de efeito de estufa.
A terceira grande responsável é a actividade agrícola. Sobretudo a pastorícia intensiva provoca um grande aumento do metano na atmosfera. Os gases libertados pelos animais e os dejectos são uma mistura explosiva para o clima.
É por estas evidências que os cientistas apelam à contenção dos meios de produção industrial e agrícola. Por outro lado, estes cientistas exigem uma maior actuação politica, no sentido de cumprir o protocolo de Quioto.
O IPCC foi criado em 1988 pelo Programa de Ambiente das Nações Unidas e pela Organização Meteorológica Mundial para estudar e propor soluções sobre os impactos das actividades humanas no clima.
Entre causas e consequências os modelos científicos apontam previsões.
AS CAUSAS
31% de aumento de dióxido carbono (CO2) desde 1750 (a maioria das emissões com origem no homem, que queima combustíveis fósseis).
151% de aumento de metano (um gás libertado pela queima de combustíveis e pela decomposição da matéria orgânica em os aterros ou lixeiras).
25% das emissões são da responsabilidade dos EUA.
CONSEQUÊNCIAS
0,6 graus Celsius de aumento da temperatura no século XX.
1990 a década mais quente desde 1861.
1998 o ano mais quente da história.
10% de diminuição do manto de neve desde os anos 60.
40% de decréscimo da espessura do Árctico.
0.2 metros de subida do nível médio do mar, durante o século XX.
AS PREVISÕES
250% de aumento das emissões de CO2 em 2100, em relação a 1750.
1,4 a 5,8 graus Celsius de aumento da temperatura até ao ano 2100.
0.88 metros de subida do nível do mar.
O aquecimento do planeta faz-se sentir, além do aumento da temperatura à superfície, numa maior frequência daquilo que os cientistas chamam de fenómenos climáticos extremos.
Assim as “anomalias climáticas” (furacões, ciclones, etc.) repetem-se com maior frequência; a água retida nos gelos polares descongela e regressa aos oceanos, pelo que o nível do mar sobe, destruindo o litoral e apagando algumas ilhas do mapa; a seca e as inundações ameaçam os "stocks" alimentares; doenças tropicais migram para regiões antes mais frias; os ecossistemas podem entrar em desiquilíbrio.
De seguida mostramos uma síntese do que vai acontecer em alguns sectores e nalgumas regiões:
Água
Positivo: Menor risco de inundações na região Mediterrânica.
Negativo: Maior risco de inundações nos Alpes e de secas no Verão, sobretudo no sul da Europa.
Florestas
Positivo: Aumento da produtividade no Norte
Negativo: Mais fogos, e mais intensos, na região Mediterrânica.
Agricultura
Positivo: Expansão das zonas de cultivo no Norte
Negativo: Mais secas na região Mediterrânica
Pescas
Positivo: Aumento da produtividade de espécies nos mares do Norte
Negativo: Extinções locais de espécies à beira do limite
Montanhas
Negativo: Redução drástica dos glaciares alpinos; extinção de espécies no topo das montanhas; aumento do perigo de incêndios.
Transporte, energia e indústria
Positivo: Redução do números de dias com geada e neve; menor necessidade de aquecimento no Norte.
Negativo: Verões quentes e secos negativos para indústrias que necessitam de muita água; maior necessidade de refrigeração no Sul
Recreio e Turismo
Negativo: Calor excessivo em estâncias do Mediterrâneo; menor fiabilidade da cobertura de neve nos Alpes.
Saúde humana
Negativo: Maior mortalidade e morbilidade no Sul, sobretudo nos idosos, por "stress" térmico e poluição atmosférica.
A décima segunda conferência internacional do clima que hoje começa na cidade de Nairobi, no Quénia, deve reforçar os esforços na luta contra o aquecimento global, um fenómeno que ameaça a humanidade e a economia mundial.
Pela primeira vez os trabalhos desta conferência decorrem num país da África Sub-Sariana, uma região muito vulnerável às consequências do aquecimento do planeta Terra e que não tem meios para combater esta “verdade inconveniente”, de que as condições climáticas da biosfera estão a mudar, de forma rápida, por via da acção do homem.
Como no ano passado em Montreal, a cimeira de Nairobi abriga a reunião da CNUAC (Convenção das Nações Unidas para as Alterações Climáticas), assinada por 189 países dos 192 estados membros das Nações Unidas. Por outro lado, Nairobi também recebe a segunda reunião das partes do Protocolo de Quioto, ratificado por 156 países, mas abandonada pelos Estados Unidos e pela Austrália.
O protocolo de Quioto obriga a que 35 países industrializados (os chamados países do Anexo I), que representam 1/3 das emissões mundiais, reduzam até 2012 5 por cento das suas emissões de gases de efeito de estufa, essencialmente ligados à combustão de energias fósseis como o gás, petróleo e carvão.
As associações ambientalistas vão estar na cimeira do clima que hoje começa em Nairobi.
Os ecologistas vão exigir aos estadistas a garantia de que a temperatura do planeta não sobe mais de dois graus nas próximas décadas.
Esta medida só é possivel com a diminuição à escala global das emissões de gases de efeito de estufa a partir do ano 2020. Os ambientalsitas exigem também compromissos por parte dos países em desenvolvimento, que não chegaram a estar envolvidos no protocolo de Quioto; por isso Francisco Ferreira, da Quercus, que vai estar em Nairobi a acompanhar esta cimeira, diz que “está em cima da mesa um novo protocolo para substituir Quioto”.
Assim, “os compromissos a assumir por cada país deverão ter em conta o seu histórico de emissões e a capacidade de redução”, diz a Quercus em comunicado.
Entretanto, as associações de ambiente da Europa apontam para a necessidade de cumprir os objectivos já estabelecidos para a Europa, ou seja: uma redução de 15 a 30 por cento das emissões de gases de efeito de estufa (com base no ano de 1990) até 2020. Refira-se que no quadro do Protocolo de Quioto a Europa comprometeu-se a reduzir as emissões em 8 por cento até 2010, e de 60 a 80% até 2050.
E Portugal?
Portugal em 2004 estava 40,8 por cento acima de 1990 (ano de referência para as negociações), obrigando o Protocolo de Quioto a um aumento limite de 27 por cento.
O Governo já assumiu que em relação à meta de Quioto de 76,3 milhões de toneladas de dióxido de carbono (CO2) equivalente se verificará uma ultrapassagem em 5,8 milhões de toneladas/ano, implicando um custo total de 348 milhões de euros que já começaram a ser assumidos pelos Orçamentos de Estado de 2006 (6 milhões de euros) e 2007 (72 milhões de euros) através da constituição de um Fundo de Carbono.
Para assegurar o cumprimento das estimativas de cumprimento do Protocolo de Quioto presentes no Programa Nacional para as Alterações Climáticas (PNAC), publicado em Agosto de 2006, é preciso uma redução média das emissões de gases de efeito de estufa em cerca de 1% por ano entre 2004 e 2012.
O PNAC apresenta ainda as medidas de combate às alterações climáticas que os diferentes Ministérios se comprometeram a detalhar até 15 de Setembro; mas estas medidas ainda não foram calendarizadas, por isso a Quercus pede ao governo que explique porque é que cada um dos ministérios ainda não deu a conhecer estas medidas sectoriais.